Galerias Ripícolas: Guardiãs da Biodiversidade Hídrica
Cada vez que faço uma incursão pelas galerias ripícolas da Ribeira de Pera, Cavalete ou das Quelhas, ou mesmo de outro curso de água idêntico em Portugal, é com uma enorme admiração e respeito que o faço. Essencialmente pelo conhecimento dos nossos antepassados no aproveitamento das galerias ripícolas.
As galerias ripícolas são ecossistemas imprescindíveis para a biodiversidade e sustentabilidade ambiental dos nossos cursos de água, em específico nos cursos ao longo das ribeiras que acima mencionei. Estas, digamos que formações vegetais, são compostas por uma diversidade de espécies arbóreas, arbustivas e herbáceas que desempenham um papel crucial tanto na estabilidade das margens, como na qualidade da própria água e na manutenção da fauna e da flora.
A presença das galerias ripícolas está intimamente ligada à diversidade climática e geográfica de um território. Estas “comunidades vegetais” variam em composição, dependendo da região do país e das condições hidrológicas dos cursos de água que as sustentam. Por exemplo, tanto a norte como no centro do país, as galerias ripícolas são dominadas maioritariamente por espécies como o amieiro (Alnus glutinosa), o freixo (Fraxinus angustifolia) e o salgueiro (Salix spp.). Nas regiões mais secas, ou seja a sul do país, encontram-se espécies mais adaptadas a climas mediterrânicos, como o tamargueiro (Tamarix spp.) e algumas variedades de choupo (Populus spp.).
A importância destas galerias ripícolas vai muito além da sua função ecológica mais imediata. Atuam como barreiras naturais contra a erosão, prevenindo o assoreamento dos cursos de água e assim, garantindo uma melhor qualidade da água. A vegetação ripícola também desempenha um papel crucial na regulação térmica das águas, fornecendo sombra e contribuindo para a manutenção das temperaturas ideais para diversas espécies aquáticas, no caso da Ribeira de Pera, a truta. Pegando na truta, ainda acrescentar que as galerias ripícolas são um habitat para uma vasta gama de espécies animais, incluindo aves, mamíferos, répteis e anfíbios. Muitos destes animais dependem destes ecossistemas para a sua alimentação, reprodução e proteção contra os seus predadores. Espécies emblemáticas como a lontra (Lutra lutra) e diversas aves ripícolas, como o guarda-rios (Alcedo atthis), encontram refúgio nestes locais, tornando-as essenciais para a conservação da biodiversidade.
Não queria no entanto deixar de manifestar a minha preocupação com as diversas ameaças que estes locais enfrentam. A destruição e a fragmentação destas formações devido a diversos fatores como a urbanização, agricultura, construção de infraestruturas hídricas, no entanto e principalmente, o abandono. Todos estes fatores vão comprometendo a sua integridade ao longo do tempo. A “introdução” de espécies invasoras, como a acácia (Acacia spp.) e o ailanto (Ailanthus altissima), também representam desafios significativos. Assim, a proteção e recuperação de galerias ripícolas requerem uma abordagem integrada e multidisciplinar com medidas que implementem uma gestão sustentável, como corredores ecológicos, a reabilitação das margens degradadas e a remoção de espécies exóticas invasoras, ações fundamentais para garantir a sua preservação.
Os mosaicos florestais, os vários projetos de reflorestação com espécies autóctones, assim como os condomínios de aldeia, têm sido importantes na recuperação da funcionalidade ecológica destes sistemas.
Ribeira do Cavalete – Castanheira de Pera | Serra da Lousã
Para além das iniciativas quer de um âmbito governamental quer institucional, é essencial também envolver as comunidades locais nesta proteção destes habitats. Educar sobre a importância destas galerias ripícolas e a promoção de boas práticas de uso da terra irão contribuir significativamente para uma preservação a longo prazo. Programas de pedestrianismo, educativos junto das escolas, podem incentivar a uma participação ativa na monitorização e na proteção destes ecossistemas.
Para concluir, dizer uma vez mais que as galerias ripícolas desempenham um papel imprescindível na manutenção da biodiversidade, na proteção dos recursos hídricos e na estabilidade ecológica dos nossos cursos de água. No entanto, para que continuem a cumprir estas funções, é fundamental implementar estratégias eficazes de conservação e gestão das mesmas. Uma conjugação de esforços entre entidades governamentais, académicas e sociedade civil é um objetivo a seguir para assegurar a perenidade destes ecossistemas, garantindo um futuro mais sustentável para os rios e ribeiras do nosso país.
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