“Introducing Portugal | NATO Documentary | 1955”
De quando em vez, revejo o documentário da NATO “Introducing Portugal | The Atlantic Community Series | NATO Documentary | 1955”. É-nos apresentado como uma obra que combina a geografia, cultura, economia e o papel estratégico de Portugal dentro da Aliança Atlântica. Produzido em plena década de 50, é um retrato oficial que reflete não só a visão de Portugal como aliado ocidental, mas também “insinua” o esforço de projeção internacional de um regime que desejava ser reconhecido e respeitado no palco internacional.
Para um espectador de Castanheira de Pera, o filme ganha um significado especial ao incluir referências específicas e imagens de locais familiares. Por exemplo, ao minuto 5:45, surgem no nosso ecrã, o Santo António da Neve, local da então freguesia do Coentral Grande. Um sítio com história ligada ao armazenamento de neve, que servia Lisboa, e simbolizava o engenho e a resiliência das comunidades serranas desta região. Ver aqueles Poços de Neve em 1955, é um momento, é um testemunho visual de tradições profundamente enraizadas na Serra da Lousã, revelando um orgulho coletivo pela tenacidade e trabalho destas gentes.
Mais à frente, ao minuto 6:14, vemos a aldeia do Candal, a terra dos meus avós maternos, uma aldeia de xisto, a mais bonita aldeia de xisto incrustada na paisagem serrana. Aqui observamos um pequeno vislumbre do modo de vida rural, sublinhado pela simplicidade, autenticidade e a forte ligação à terra que caracteriza a região. Imagens que apelam à minha memória familiar e à minha continuidade e identidade enquanto pessoa e cidadão.
Rebanho na aldeia do Candal – Lousã (1955)
Apesar de todo o fascínio cultural e pitoresco, não posso ignorar que este documentário é também apresentado como uma peça de propaganda ao regime de Salazar. Filmado em plena vigência do Estado Novo, esta obra exalta a imagem de um país em harmonia, trabalhador e disciplinado, sem mencionar as restrições de liberdade e as desigualdades sociais que marcavam a realidade. Este tipo de produção audiovisual visava mostrar Portugal como um aliado forte e estável dentro da NATO, escondendo a repressão política e os limites impostos às vozes dissonantes da época. A narrativa construída é um reflexo de como o regime procurava projetar uma imagem controlada e idealizada no exterior, disfarçando-se de modernidade e estabilidade em pleno contexto de Guerra Fria. Ao mesmo tempo, onde estamos perante uma cápsula do tempo fascinante e repleta de detalhes históricos e culturais, estamos também a ver um “veículo” de propaganda que nos lembra da complexidade de interpretar o passado com uma visão crítica e informada. Tal combinação de beleza e controvérsia faz do documentário um material essencial para compreender as múltiplas camadas da história portuguesa e os desafios de conciliar memória e verdade.
Deixo a recomendação.