
O último guardião do 42.1 no Santo António da Neve
O último guardião do 42.1 no Santo António da Neve, o meu Avô.
42.1 é o Indicativo, o código de identificação do Posto de Vigia do Cabeço do Pereiro mais conhecido por Santo António da Neve. Instalado a 1193 metros de altitude começou a sua operacionalidade na forma como o conhecemos hoje no longínquo ano de 1971, segundo a Direcção Geral das Florestas. Segundo o meu avô, este começou a trabalhar em 1969 mas numa “barraca”, sim “barraca” e por lá esteve alguns anos, cerca de cinco ou seis, até à construção que hoje conhecemos. Em termos de datas, estas não são então muito precisas.
Nessa época até 1996, o posto de vigia funcionava durante todo o ano pois era necessário transmitir mensagens de ambos os lados da Serra, e sem repetidores automatizados sem a tecnologia que hoje em dia abunda, eram necessário meios humanos. O meu avô.
Como se deve calcular, trabalhar a quase 1200m de altitude não é fácil. Ainda hoje não o é. A grande diferença é que naquela época escasseava o aquecimento. Havia a hipótese do gás, que chegava de quando em vez para remediar. Os rádios funcionavam com baterias porque a rede de electricidade era ainda uma miragem. Inicialmente, miragem era também a estrada para o Santo António via Coentral, sendo o único acesso via Trevim. Dizer ainda que inicialmente a ida para o trabalho era feito a pé pelos caminhos de então, a motorizada veio alguns anos depois.
Frequentava eu a escola primária do Coentral em 1988, são estas as minhas primeiras recordações. Fosse qual fosse a época do ano, lá vinha o meu avô ao final do dia a passar ao fundo da escola, descendo a estrada de terra batida para o Coentral na sua Macal. Sim, nesta altura já havia estrada do Coentral para o Santo António.
Alguns dos que estão certamente a ler este texto, conhecem o meu avô. Por lá, somente no verão passaram dezenas de jovens e menos jovens que o acompanharam na missão de descobrir o mais rapidamente focos de incêndios florestais. Desde o Coentral, Castanheira de Pera, Lousã, Poiares, Miranda do Corvo e até Coimbra. De todas estas localizações por lá passaram os “vigias”.
Eu ainda lá fui um dia ou outro nas férias, verão ou inverno, mas o meu tio Francisco que já não se encontra entre nós, e o meu tio/padrinho Anselmo, que ingressou mais tarde nos Serviços Florestais como Guarda Florestal também por lá passaram. Haverão por aí muitas histórias por contar desse tempo, desse saudoso tempo.
Hoje o 42.1 ainda está em funcionamento, mas apenas no verão. É assim desde que o meu avô se aposentou. É ele então o “Último Guardião do 42.1”.
Mas quem é o meu avô afinal?
Chama-se Américo Bernardo, é natural da aldeia do Candal, Concelho da Lousã, nascido a 10 de maio de 1937.
Nota Adicional: Américo Bernardo nos Arquivos da RTP no Programa “Sabe como se Salva uma Floresta?” de agosto de 1974 …
Ver primeira parte: https://arquivos.rtp.pt/conteudos/sabe-como-se-salva-uma-floresta-parte-i/
Ver segunda parte: https://arquivos.rtp.pt/conteudos/sabe-como-se-salva-uma-floresta-parte-ii/
Jorge, apesar de não ter sido vigia, cheguei a trabalhar alguns verões na pista de abastecimento de retardantes aos aviões de ataque aos incêndios que se encontra logo ao lado e tive o previlégio de conhecer e privar com o teu avô durante bastante tempo. Aprendi bastante com ele. Homem sábio, o teu avô.
Conheci e partilhei muitos bons momentos com o teu avô. Trabalhei dos meus 15 aos 21 anos no Posto Vigia 42-1. Partilhei esse Posto de Vigia com o teu avô desde 1978 a 1983.
Que saudades desse tempo. Bons momentos e recordações.